Pondo a culpa no sofá…
Todos conhecem a estória do marido que, ao ver a esposa lhe traindo
em cima do sofá, imediatamente vai a uma loja de móveis e dá conta de
comprar um outro assento tentando garantir que fatos como aquele não
ocorram novamente. É mais ou menos esta a sensação que temos quando
lemos manchetes como a que segue, tratando de uma “mudança” de
orientação na Polícia Militar do Ceará:
Polícia Militar do Ceará é reestruturada e adota linha dura
Polícia que se propunha ser comunitária começa a mudar de rumo
após casos de condutas inadequadas, abordagens desastrosas e crescimento
nos números de violência
Soldados da Polícia Militar do Ceará usam viatura como “motel” e são
expulsos. Vídeo flagra policiais espancando e depois liberando suspeitos
. Adolescente é morto com tiro na nuca por PM novato. Para o comando
militar, as condutas inadequadas e abordagens desastrosas são casos
isolados. Para especialistas, reflexo de uma política de segurança
pública equivocada. A despeito do debate, essas falhas, somadas ao
crescimento da violência e a defasagem de homens no Estado, levaram o
governo Cid Gomes (PSB) a iniciar uma reestruturação da corporação e a
endurecer ao longo dos últimos anos uma polícia que se propõe
comunitária.
[...]
Implantado em 2007 [o programa Ronda no Quarteirão], a estratégia de
policiamento de proximidade consiste em ter uma viatura para atender
áreas de até três quilômetros quadrados.
Com equipes fixas, a ideia era que os policiais interagissem mais com
a comunidade. Para facilitar esse contato, o governo resolveu criar uma
identidade visual ao programa e deu fardamento especial, treinamento
específico e aparelhamento diferenciado aos soldados do Ronda. Essa
“nova polícia” passou então a dirigir luxuosas caminhonetes de cabine
dupla modelo Hilux SW4 com ar-condicionado e câmbio automático, no valor
estimado de R$ 150 mil cada.
Com a expansão dessa estratégia de policialmente para o interior do
Estado, em abril de 2010 foi criado o Batalhão de Policiamento
Comunitário (BPCom) – hoje formado por aproximadamente 3,9 mil
policiais. Com comando próprio e regalias como gratificações extras,
gerou-se a impressão de haver uma polícia dentro da polícia.
O ex-secretário Nacional de Segurança Pública, coronel da reserva da
PM, José Vicente da Silva Filho, tido como um dos maiores especialistas
da área no País, chegou a ser convidado por Cid Gomes para auxiliar na
organização do Ronda do Quarteirão. Os dois se encontraram, mas o
coronel recusou a proposta.
“Fui conversar com ele e falei que o projeto estava equivocado e não
iria dar certo. Ele resolveu fazer uma polícia à moda a dele. Com uma
Hilux, poderia comprar três boas viaturas. É um aparato marqueteiro”,
contou ao iG . “O problema do Ronda é o tratamento diferenciado dado a
um grupo que faz trabalho na polícia. O restante fica ressentido e
olhando mal esse grupo de estranhos.”
Cid Gomes ignorou os conselhos do especialista e bancou o projeto,
que mais tarde veio a servir de referência para outros Estados
brasileiros. No início, a presença massiva das viaturas nas ruas levou à
população cearense uma sensação de segurança. Com o passar do tempo,
constatou-se que não houve diminuição da violência. A taxa de homicídios
a cada 100.000 habitantes subiu 80% em dez anos. Em 2000, o índice no
Ceará era de 16,5 mortes. Em 2010, chegou a 29,7. Os dados constam do
Mapa da Violência 2012, do Instituto Sangari.
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